Flavya Mutran

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Res_Publicae

Técnica: Vídeo, duração aproximada de 4min.
Animação digital de fotografias públicas de ex-(quase) presidentes da República do Brasil.
Autor: Flavya Mutran
Local e data: Porto Alegre/RS, setembro de 2021

Sobre a artista

Flavya Mutran é professora e pesquisadora do Departamento de Artes Visuais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde também fez doutorado e mestrado. Atua no campo da arte, design gráfico e comunicação desde os anos 1990, já tendo trabalhado como laboratorista e repórter fotográfico para jornais, revistas e assessorias de comunicação pública e privada. Participa de exposições coletivas, salões de arte e fotografia, no Brasil e no exterior, tendo recebido prêmios e com obras na Coleção Pirelli/MASP (São Paulo/SP); na Biblioteca Nacional e na Coleção Joaquim Paiva em comodato no MAM-RJ (Rio de Janeiro/RJ); na coleção de Fotografia Contemporânea Paraense do Museu de Arte Contemporânea do Pará, na Fundação Rômulo Maiorana (Belém/PA); no MARGS – Museu de Arte do Rio Grande do Sul e MAC-RS (Porto Alegre/RS). Atualmente dedica-se a pensar relações entre fotografia e obras gráficas nos processos formativos e de criação em poéticas visuais.

Quase todas as fotografias que deram origem a essas simulações digitais saíram da galeria histórica do Palácio do Planalto, e é justamente essa galeria, ou melhor, os estranhos critérios de sua composição que motivaram esse trabalho. Na galeria oficial há 38 retratos que supostamente marcam cronologicamente o mandato de todos os presidentes do Brasil, de 1889 até os dias atuais, em 2021. É sabido que nesses quase 132 anos de República Federativa, o Brasil teve mais mandatários do que os que estão contabilizados na intricada matemática sucessória que soma apenas 37 homens e 1 mulher.

Oito dos treze homens reunidos em Res_Publicae não fazem parte da galeria do Planalto. Dois foram oficialmente eleitos e depois substituídos por outros seis. Três sequer tomaram posse, e apenas um deles está na galeria sem nunca ter subido a rampa do Planalto. Nenhum dos treze homens do vídeo ficou mais que 100 dias no cargo.  Relacionar apenas números e não nomes e datas a esses rostos algorítmicos coloca em xeque não “quem” esteve ou está ocupando um cargo público, mas sim “como”, “porque” e “quais” as forças que estão por trás dessas conduções. 

O som estridente que acompanha esses rostos vetorizados, como uma espécie de presságio para novos áugures*, em parte representa muito da intricada trama que ainda entrelaça os elos dos três poderes da República Brasileira. A expressão Res Publicae – do latim, que deu origem a palavra República -, diz respeito ao que não é privado, e sim ao que é mantido em conjunto por muitas pessoas, literalmente “coisa do povo”. Os critérios de inclusão ou de ocultação de informações sobre os eventos que envolvem personalidades históricas dizem muito mais sobre como as narrativas oficiais são construídas na História do nosso país, do que os documentos públicos que deveriam ser de interesse coletivo.  

Ainda que a tecnologia atual possa artificialmente animar os olhos e gestos desses treze rostos do passado, isso não nos valeria sequer uma palavra. Fotografias são testemunhas mudas do passado e, não fosse sua inclinação original para a ficção ser mais sincera do que sua vocação para a verdade, fotografias não seriam nada além de entretenimento fugaz exibidas em Museus. 

*Segundo o dicionário, ÁUGURES são os “títulos dados às pessoas que na antiga Roma interpretavam sinais para as autoridades do governo. Os romanos acreditavam que os deuses revelavam seus desejos através de certos sinais ou agouros, como o trovão e o relâmpago, o vôo e o canto dos pássaros, o movimento das serpentes e dos camundongos.”