Nina Matos

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Sangue do Brasil

Vídeo Sangue do Brasil – Nina Matos
Argumento e direção: Nina Matos
Montagem e efeitos : Paula Luiza Ribeiro
Músicas: Patrick Sainton – duduk-drone ; Raimundo Caetano Grupo de música Desana – Vara Sagrada
Duração: 00:07:36
Ano : 2021

Sobre a artista

Nasceu em Abaetetuba-Pa, formada em artes plásticas pela Universidade Federal do Pará, iniciou carreira artística em 1990, já tendo participado de diversas coletivas em cidades como Belém, São Paulo, Rio de Janeiro e Almada (Portugal).

Realizou as individuais: “Pinturas” (1991), ”Imagens Insólitas” (1994), ”Banquete Sincrético” (2001) e “Inéditos e Dispersos” (2002), em “Circuito das Artes/ Triangulações” (2014) e “Aniversário de Dois” (2014). Tem participação em diversos Salões Nacionais de Arte incluindo premiações no Arte Pará, Salão Unama de Pequenos Formatos e Salão da Paraíba. Em 2005 recebeu bolsa de estudo do Ministério da Cultura da Espanha para cursar arte em Madri, em 2006 foi selecionada no Projeto Rumos Visuais do Itaú Cultural.

Coordenou a Galeria Municipal de Arte, dirigiu o Museu de Arte de Belém (2002/2004) e o Museu Casa das Onze Janelas(2007/2010) onde instituiu o Prêmio SIM de Artes Visuais . Atuou no Conselho Nacional de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura – Cnic/Minc, como Conselheira Titular de Artes Visuaisnos biênios 2011/2012 e 2013/2014. Atualmente desenvolve ações de curadoria no Museu de Arte de Belém.

Sangue do Brasil,  um réquiem à vidas de líderes indígenas e florestas tombadas, um grito de urgência nestes anos de trevas que seguem. Um libelo contra violência oficializada, um profundo respeito e homenagem à estes verdadeiros heróis, tombados na defesa da Vida. Sangues do Brasil.

O vídeo traz imagens da crônica diária do presente e passado recente, de violências contra indígenas, intercaladas por imagens de obras de minha autoria, da Série “Tributo : alegorias, espiritualidade e posteridade”, que reflete situações de domínio e mimetismo de padrões sociais erguidos às custas de criminosos apagamentos culturais , surgindo de apropriações de iconografia e bibliografia histórica, como também de questões urgentes e perenes de conflitos e identidades sociais, operando através de um olhar crítico social sobre representações oficiais construídas e seus significados.

Em uma sequência inicial de imagens, ações de “pacificação” e militarização indígena,   surgindo em primeiro, obras minhas, nas quais emolduro em painel alegórico de azulejaria portuguesa ( simbolicamente nossa primeira dominação), registros históricos, relacionados à “pacificação indígena” do início dos anos 20 do século XX, onde na primeira, podemos observar membros da etnia Caingangue, todos devidamente vestidos com roupas que escondem seus códigos e inscrições culturais identitárias, um deles envolto ao símbolo que nos identifica como nação ,a bandeira nacional,   posando para a posteridade de uma paz nunca realmente estabelecida,  uma “paz” imposta, visto que era isso ou a dizimação. Nem respeito e nem asseguração de direitos, promessas nunca cumpridas. Uma pacificação forjada para dominar ideologicamente, legalizar invasões e reduzir territórios do povo invadido, protegendo na verdade a sociedade regional de pressupostas agressões indígenas, e na outra, meninos indígenas, “representantes de três etnias do alto sertão do Mato Grosso, alunos de um colégio do Rio de Janeiro” (legenda da imagem do livro Pelo Índio e Pela sua Proteção Oficial – Luiz Bueno Horta Barbosa–1923 /Comissão Rondon) . Em seguida, outro momento de militarização indígena, onde surgem imagens de membros da GRIM, a Guarda Rural Indígena, criada em 1969 pela Ditadura Militar, para camuflar barbáries que vinham sendo praticadas contra os povos originários, gerando uma falsa realidade de proteção de indígenas feita por eles mesmos, onde foram recrutados  integrantes das etnias Xerente, Maxacalis, Carajá, Kraô e Gaviôes, o que resultou em uma excrescência na cultura indígena.  

Seguindo depois,  imagem de outra obra de minha autoria, “Ecce Homo”, uma alegoria dando visibilidade à uma questão de ordem no Pará, o extermínio sem trégua de indígenas e povos da floresta, enquanto o poder governamental se exime de responsabilidades sobre uma região em permanente degradação, conflitos e violação de direitos.  Na imagem, a imolação do indivíduo é perene sob a “guarda” do Estado brasileiro.

E então surge a imagem da “Medalha de Sangue do Brasil”, comenda criada com o objetivo de  agraciar oficiais, praças, assemelhados e civis, destacados para o teatro de operações na Itália, e que ali tivessem sido feridos em consequência de ação objetiva do inimigo. Na contemporaneidade, essa condecoração continua agraciando fardados que tombam em operações militares. Ressignifico tal comenda, para condecorar lideranças indígenas , tombados na atualidade em plena luta por suas terras e pela preservação da natureza, contra a barbárie praticada contra seu povo e ações de exploração predatória. Sangues do Brasil, com imagens de alguns deles como Paulino Guajajara, Zezico Guajajara e da jovem liderança indígena paraense, Isac Tembé, assassinado por militares,  em fevereiro deste ano. Em seguida, surgem e apagam-se, todos os nomes de lideranças assassinadas de 2019 à 2021, seguidos pela sequência de imagens , de criminosos incêndios florestais.

Finalizando, para fazer frente à tantas violências, dou a devida reverência aos saberes míticos, à grandiosidade espiritual deste povo no qual encontro-me inserida , apresento a imagem de outra obra de minha autoria, a alegoria do “ Guardião sob o Manto”, evidenciando a Pajelança (Xamanismo Brasileiro) . Para o sábio da floresta a Natureza é viva e tem alma. Desta maneira, cada elemento da Natureza está entrelaçado com o outro. Na imagem, o  Xamã amazônico , ritualiza , tendo como fundo um mapa de demarcação de terras indígenas da Região Norte. Sob o manto Tupinambá, usado nos primeiros tempos, em rituais de canibalismo, ele busca em transe xamânico , guardar essa terra e natureza tão desrespeitada e explorada quanto a própria história do seu povo .