Octavio Cardoso

Sem título. Série Lugares imaginários.
Fotografias digitais em mp4 de 40’27”.
Sobre o artista
Nasceu em Belém – Pa, em 1963.
Exposições Individuais
1998 – “Eu vejo, tu sonhas”, galeria Fidanza, Belém, Pa. 2009 – “Lugares Imaginários”, galeria Fotoativa, Belém, Pa. 2013 – “Silêncio…”, Kamara-Kó Galeria. Belém, Pa. 2015 – “Minha ilha – campos abertos do Marajó”, Museu Paraense Emílio Goeldi.
Exposições Coletivas
1987 – “Revelação – Dez Jovens da Fotografia Brasileira”, INFoto / Funarte, Rio 1993 – “Panorama da Fotografia Contemporânea Brasileira”. SESC – Pompéia, São Paulo. 2000 – “Brasilianas: Fotógrafos de Belém do Pará”, exposição coletiva, Centro Português de Fotografia, Porto, Portugal. 2005 – “Une Certaine Amazonie” – exposição juntamente com Eduardo Kalif, em Seine-Saint-Denis, França.
2010 – “18ª edição da coleção Pirelli – MASP” – MASP, São Paulo. 2014 – “Pororoca – a Amazônia no MAR”, MAR, Rio. 2015 – “Gestos, relatos, escritas e autoficções”, Tiradentes e Belo Horizonte, MG.
2016 – “A Cor do Brasil”, MAR, Rio. 2017 – “Antilogia: o fotográfico na Pinacoteca”, Pinacoteca de São Paulo. 2017 – “Feito Poeira ao Vento | Fotografia na coleção MAR”, MAR, Rio.
Prêmios
1987 – Prêmio VI Salão Arte Pará. 2009 – Bolsa de Pesquisa e Experimentação Artística do IAP – Instituto de Artes do Pará. Projeto “Lugares Imaginários”. 2010 – Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia – Categoria Brasil Brasis. 2014 – Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia. Projeto “Minha Ilha – campos abertos do Marajó”. 2017 – Prêmio Pesquisa e Experimentação Artística da Fundação Cultural do Pará. Projeto “Notícias nem sempre felizes”.
Obras em acervos:
Museu Casa das 11 Janelas, Belém, Pa. Museu da Universidade Federal do Pará, Belém, Pa.
Coleção Amazoniana de Arte da UFPa., Belém, Pa. Museu de Arte de São Paulo. Coleção Pirelli / MASP, São Paulo. MAR – Museu de Arte do Rio, Rio de Janeiro. Pinacoteca de São Paulo.
“A fotografia foi a maneira que encontrei de tentar organizar meu mundo, a maneira de organizar as coisas, criar um lugar calmo, silencioso, quase perfeito. Como isso não é possível no mundo real, a fotografia passou a ter essa função na minha vida. Só que, de vez em quando, as coisas escapam de nosso controle e aparecem fotos como a do barbeiro que tem mais tensão, confronto.” (Octavio Cardoso )
“Cheguei à conclusão de que sempre estive atrás de criar refúgios, pequenos refúgios onde eu pudesse me proteger, talvez descansar da realidade” (O. C.).
Quando mais se aproxima do monocromo, mais reduz a paleta, mais demarca o espaço de vastidão e calma da floresta, mais economiza índices iconológicos, mais desabita o lugar, mais cala a pororoca… mais a fotografia de Octavio Cardoso captura rumores no interior do silêncio, particularidades das diferenças gritantes entre folhas ou entre gotas, a volúpia da vida, a entropia do ambiente, a inconstância da água e situa pequenos desassossegos do insidioso tyché da imagem, cede ao infatigável trabalho do inconsciente organizado – lacanianamente – como cadeia de significantes. Mais ela é polissêmica em oposição à verborragia iconográfica e à falação exótica macunaímica. Esses Lugares imaginários situam-se entre a tensão infiltrada na linguagem e a iminência de cumprir uma tarefa simbolizadora, não da Amazônia, mas do inefável que nos captura. O estado de vigília de Paisagens imaginárias justapõe em seu paradoxo a vontade de silêncio à fonética articulatória da linguagem. A fotografia buscaria a última fronteira do indizível (daí, sua ideia de silêncio e afonia), como a obra gráfica de Mira Schendel, pra enunciar a própria contingência humana. Nessa selva, a fotografia é “quase animal (tal foto e não a Foto)” e o olho não busca refúgio do embate com a fera iconófaga azul. A chroma insidiosa infiltra tensão na promessa de repouso aspirada pelo código civilizado das fantasias do paraíso terrenal azul – “A Terra é azul!” (exclamação do astronauta Neil Armstrong) – no enfrentamento do inacessível Real do Inferno Verde. Na paleta amazônica – o campo de repouso e de espera da linguagem e o território extra-razão, fatigado do studium – não tem International Klein Bleu.
Paulo Herkenhoff
¹ Entrevista a Amanda Aguiar, acessado em agosto de 2014 no site Kant_O_Photomático http://kantophotomatico.blogspot.com.br/2010/08/sonhos-em-tons-de-cinza.html
² Paráfrase de BARTHES, Roland. La chambre claire: Note sur la photographie (Gallimard/Seuil/Cahiers du cinéma, Paris, 1980, p 184. Barthes discute os conceitos de tyché e studium.
Parto do princípio de que o conceito de paisagem é polissêmico. Tal afirmação refere-se ao fato de que a noção de paisagem encerra inúmeros sentidos, conforme o campo teórico e a perspectiva estética ao qual está filiado quem a interpreta enquanto um fenômeno oriundo da experiência humana do mundo.
Flávio Leonel Abreu da Silveira
O antropólogo Abreu da Silveira defende a ideia da “inexistência de uma paisagem que não seja cultural”, considera que “o olhar sempre culturaliza o ambiente”. Há anos Octavio Cardoso vem emprestando o seu olhar para selecionar e fotografar diferentes paisagens, com as quais se relaciona. Em 2009, Cardoso foi contemplado com a Bolsa de Pesquisa Experimentação e Criação Artística do Instituto de Artes do Pará (IAP), quando desenvolveu o projeto Lugares Imaginários, exposto no FotoAtiva. Com imagens também pertencentes a essa série, recebeu, em 2010, o Prêmio “Diário Contemporâneo de Fotografia”, na categoria “Brasil Brasis”.
O preto e branco sempre acompanhou a trajetória do fotógrafo que preferia os tons cinza à cor. Lugares Imaginários demarca o envolvimento com um universo colorido, caminho resultante da experiência com a câmera digital. Daí em diante Octavio Cardoso continua a manter o apuro técnico, mas passa a reorganizar diferentes procedimentos, alterando o ISO, atuando na luminosidade da foto, propondo a monocromia onírica que permite ir além do real. Com essa atitude, talvez retome 1998 quando, ainda em preto e branco, tenta a reconstrução de um lugar só seu, em sua primeira individual Eu vejo tu sonhas. A paisagem azul, o vermelho utópico e o cinza irreal que ora se apresentam advêm do passeio solitário, da paisagem observada que se confunde com a paisagem íntima, construída no silêncio, no encontro consigo mesmo.
A paisagem “é um fenômeno do ser porque tem relação com o sujeito que sonha” e Cardoso registra/cria imagens aliando o imaginário àquilo que vê; atravessa com sensibilidade um território suspenso que nos torna habitantes de espaços vazios, os quais se complementam com narrativas imaginárias que vivemos, que sonhamos. Trata-se de um pequeno refúgio que exige o tempo da contemplação, ato cada vez mais em desuso. São paisagens de ausências, um nada ou quase nada, para ver, sentir, pensar … em silêncio.
Marisa Mokarzel
¹ As citações aqui utilizadas referem-se às afirmativas do antropólogo Flávio Leonel Abreu da Silveira e encontram-se no artigo “A paisagem como fenômeno complexo, reflexões sobre um tema interdisciplinar”, que compõe o livro, organizado por ele e por Cristina Donza Cancela, Paisagem e Cultura: dinâmicas do patrimônio e da memória na atualidade, publicado em Belém, pela EDUFPA, em 2009 (p. 71 a 83).